Tenho estado sempre aqui presente, esperando por ti. Desde sempre tive a certeza que toda a minha vida tinha estado esperando por ti e por isso não hesitei em assumir uma relação contigo quando me disseste que querias algo mais, que já estavas cansado de ser só meu amigo colorido e que me querias só para ti, querias que eu fosse a tua coisa boa, só tua. Naquele momento, e durante muito tempo, tive a perfeita noção de que aquela era a decisão correcta, e que tu, defeitos incluídos, eras a pessoa com quem eu queria ficar para o resto da minha vida. Sentia-me incrivelmente feliz por acordar ao teu lado, quando me enviavas alguma mensagem ou ligavas do escritório só para me dizer que já estavas a morrer de saudades do meu calor. Tudo aquilo era o que eu sempre tinha desejado mesmo sem nunca o ter assumido... E isso tudo continuava a fazer-me feliz mesmo quando te ausentavas naquelas viagens de trabalho e eu ficava em casa todo o fim-de-semana esperando pelo teu regresso…
Mas as viagens foram tornando-se cada vez mais constantes e já não tinhas tempo para os meus telefonemas e eu tive que me voltar a habituar a dormir sozinha todas os fins-de-semana, às vezes toda uma semana. E as esperas foram ficando cada vez maiores e a minha saudade começava a doer-me nos ossos e já não eras tu a minha habitual companhia dos sábados, nem dos cafés ao meio da tarde, mas sim o Paulo. O mesmo Paulo que nos apresentou, o teu amigo de infância, esse Paulo era agora o meu melhor amigo, o meu confidente que sempre ouvia os meus queixumes sobre a tua tão pouca presença... O café da tarde já não era teu e meu, era antes meu e dele.
De cada vez que voltavas pra casa o meu coração já não batia com a mesma força do início, os meus poros não deixavam transbordar a mesma percentagem de emoção de antes e a tua presença foi-se tornando, pouco a pouco, um acessório na minha vida...
Quando íamos ao centro tomar o café da tarde o Paulo já estava sentado à mesa esperando por nós... O café da tarde já não era de nós dois, era antes de nós três.
Um dia, aliás uma noite, tinha bilhetes para o teatro, era a estreia, tínhamos combinado de nos encontrar a porta porque tu chegarias directo de Lisboa onde tinhas ido tratar de uma papelada na sede da empresa, mas nessa noite, onde a brisa soprava ao de leve e fazia o meu vestido novo, comprado especialmente para aquela noite, dançar, tu não apareceste à hora marcada e eu, cansada de esperar que viesses, entrei e acabei por assistir à peça sozinha. Quando saí e liguei o telemóvel não recebi nenhum relatório de entrega de todas as mensagens que te enviei. Ainda pensei em ligar-te, mas pelos relatórios ainda pendentes sabia que tinhas o telemóvel desligado, então decidi ligar ao Paulo para que me desse uma boleia para casa, podia ter chamado um táxi, mas sentia-me só e sabia que a sua companhia me iria fazer bem, sempre tão bem disposto, sabia que me iria animar. Liguei-lhe e em menos de nada ele apareceu, falamos do acontecimento e em vez de me levar para casa convidou-me a uma festa de aniversário de uma amiga, onde me pude desligar um pouco e passar um bom bocado. Quando a festa terminou já íamos tocados e, no escuro da noite, ao ver-me ali chorando a tua ausência, no silêncio do carro, um beijo aconteceu...
Aconteceu um beijo e depois outro e depois outro e, ali, com o carro parado na berma eu e o Paulo fizemos amor. Depois dessa noite, na manhã do dia seguinte acordei contigo ao meu lado e, ao ver-te ali deitado, lembrei-me do que tinha feito, mas, apesar do que eu creia, não senti remorsos ou culpa, senti apenas que, naquele momento estava um perfeito estranho dentro da minha casa, deitado na minha cama.
Depois daquela noite vieram mais noites, vieram mais dias até um ponto onde tudo aquilo tinha deixado de estar sob o meu controle. Às vezes parava para pensar e achava que não deveria estar a fazer aquilo, que tu me amavas e que a minha traição a ti não podia prolongar-se mais no tempo. Tentei várias vezes terminar esta relação proibida, mas sempre sem grande sucesso pois quando tu não estavas, e estavas cada vez menos, eu corria para os braços do Paulo, para a cama dele e o meu mundo ganhava outra cor; tudo o que longe dele era pesado, ao seu lado se tornava etéreo e se dissolvia no ar...
Um dia chegaste de surpresa a casa, estava eu já vestida para ir ao cinema com o Paulo. Chegaste e elogiaste a minha indumentária, sorriste para mim com aquele sorriso rasgado que fazia tempo eu não tinha o prazer de ver, olhaste para mim e disseste " Vamos dar uma volta, hoje sou só e todo teu" mas eu recusei, disse que não podia, que tinha um compromisso inadiável, que hoje quem não podia era eu, que enquanto eu não voltasse fosses tratando de papelada como era o costume ultimamente. Disse-te aquilo tudo com a intenção de picar bem dentro, de deixar marca, com o intuito de que notasses que tinhas estado muito ausente e distante. E tu notaste-o. Sentiste a picada, pela expressão do teu olhar, e nesse instante, apercebeste-te que me tinhas negligenciado demais, sem reparação possível, sem emenda...
E foi por isso que te trai...
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